O trabalho remoto é o grande vilão da vez?
Algumas reflexões sobre como ter uma visão estratégica sobre este assunto.
Essa semana eu caí num vídeo do Lucas Montano comentando sobre uma declaração do Sam Altman, criador da OpenAI, falando que "definitivamente, o trabalho remoto foi um dos maiores erros da indústria tech".
Por causa da pandemia, o trabalho remoto virou um padrão na indústria tech. Isso é um fato que todo mundo comemorou. Trabalhando de casa as pessoas não precisam mais pegar trânsito. Essa economia de tempo trouxe mais qualidade de vida. Agora existe tempo pra academia, para o Netflix, para o Valorant. Não conheço um dev que não tenha amado isso.
Já as empresas começaram a encontrar algumas dificuldades. Ficou mais difícil de se comunicar de forma efetiva. Muitas viram a produtividade cair de forma significativa. Alguns casos, inclusive, movidos por má-fé de programadores que escondiam o fato de ter dois, três, e até quatro empregos.
Nesse cabo de guerra, quem está certo? A empresa ou o dev? Essa discussão entrou no hall da fama das discussões apaixonadas, como eram antigamente futebol e religião e, atualmente, a política.
Eu trabalho remoto desde 2014 e todas as minhas empreitadas, desde então, são com times 100% remotos. Levando em conta essa bagagem, eu resolvi dar o meu pitaco sobre como você pode ter uma visão estratégica sobre este assunto.
Sobre o Trabalho Remoto
O meu último emprego com carteira assinada foi em 2014. Nessa época, eu precisava cruzar a cidade de São Paulo diariamente para trabalhar. Eram 1h para ir e 1h15 para voltar. Para completar, eu trabalhava de roupa social. Era horrível.
Por causa desse problema de logística e também por outros motivos (que não vêm ao caso citar), eu decidi pedir as contas e começar a fazer freelas. Desde então o meu ambiente de trabalho passou a ser o meu quarto.
Foram alguns bons anos investindo em conhecimento sobre rotina, produtividade, e sobre como ser produtivo "sem ninguém me vigiando". Também foram muitos os investimentos em ambiente e infraestrutura. Eu cheguei a reformar a casa da minha mãe (onde eu morava, na
época) para criar um escritório para mim. O primeiro apartamento no qual morei tinha um cômodo reservado para meu escritório. O atual também tem. Quando eu cheguei aqui tudo ainda era mato.
Assim foram os meus últimos 10 anos: trabalhando remotamente. O time da Codevance sempre foi 100% remoto. Tem gente que trabalha comigo há anos e que eu nunca conheci pessoalmente. Foi o mesmo caso quando eu era sócio na DevPro. Agora é o mesmo caso no Tintim, meu novo empreendimento. Foram alguns bons anos masterizando a arte de trabalhar remoto e aproveitando de todos seus benefícios.
Esses benefícios são inegáveis e até meio óbvios. A essa altura do campeonato, falar deles é chover no molhado. É notório como a qualidade de vida das pessoas melhorou e também como as chances ficaram mais equalizadas. Tenho amigos que moram no interior do interior do Brasil e ganham em dólar, trabalhando para a gringa. Nunca antes na história do capitalismo isso foi possível.
Os benefícios são ótimos, mas e os malefícios? Será que, no médio-longo prazo, faz bem para a cabeça ficar enjaulado no mesmo ambiente sem ter nenhum tipo de interação social durante todo o dia? E a capacidade e maturidade das pessoas de conseguir estabelecer limites claros entre o que é vida pessoal e vida profissional? Conheço muitas pessoas que dormem, trabalham e se divertem no mesmo ambiente. O quanto isso é saudável, psicologicamente falando?
Eu sempre fui 100% #teamRemote. Entretanto, nos últimos tempos, eu comecei a refletir e considerar sobre alguns contrapontos.
O trabalho e o meta-trabalho
Em empresas de tecnologia, a cultura é um dos elementos mais importantes para que se consiga desempenhar um bom trabalho. O trabalho na tecnologia é, na grande maioria das vezes, um trabalho criativo e colaborativo. Com exceção de setores mais operacionais (como atendimento, por exemplo), o trabalho a ser exercido envolve planejamento, coordenação e execução em time. E o que dita a qualidade da atuação e a performance de um time é, primariamente, a sua cultura.
O ato de trabalhar não é só a execução de uma tarefa. A tarefa é uma ação que deriva de um grupo de seres humanos unidos em prol de um objetivo em comum. Para que esse objetivo em comum seja atingido com qualidade, não basta que esse grupo apenas trabalhe. É preciso, também, que esse grupo conviva e interaja entre si. Essas interações exercem o papel de uma espécie de meta-trabalho, ou seja, elas criam um ambiente mais propício para que um bom trabalho seja executado.
Sob a ótica da empresa, essa dinâmica social é importantíssima para a construção de um bom time. Sob a ótica do profissional, essa dinâmica social é importantíssima para a construção de uma carreira sólida.
A moeda mais valiosa na carreira de uma pessoa é a sua capacidade de relacionamento. Aquele papo no corredor, os 5 minutinhos no café, aquele happy hour de sexta-feira depois de uma semana super estressante. Isso é relacionamento, de fato. Na batida do dia a dia as pessoas se relacionam de forma profissional. Mas, o relacionamento que importa no longo prazo, é o relacionamento pessoal. O relacionamento em que as pessoas possam compartilhar os seus valores.
Esse tipo de relacionamento é muito mais difícil de ser desenvolvido de forma remota. Ninguém quer perder sua sexta-feira tomando cerveja na frente da tela do computador olhando para um monte de quadradinhos na tela do Zoom.
Levando em conta o médio-longo prazo, essa dificuldade de se relacionar remotamente resulta em duas grandes questões a serem consideradas. A primeira delas é que, sob o ponto de vista da empresa, remotamente é muito mais difícil construir e exercitar cultura. A segunda delas é que, sob a ótica do colaborador, você perde um recurso importantíssimo para a evolução da sua carreira.
Presencialmente você trabalha e convive com pessoas. Remotamente, como o Lucas diz no vídeo que citei no começo, você apenas trabalha.
Então você é a favor do presencial?
Eu sigo trabalhando de forma 100% remota, assim como todo o time do Tintim. Na minha análise, os prós ainda seguem compensando os contras. Mas eu venho ponderando cada vez mais esses fatores negativos de longo prazo. Reunir-se presencialmente uma vez por semana poderia ser uma alternativa, talvez.
Mas eu não quero que você se importe com a minha opinião. Eu também não quero que você se importe com a sua própria opinião.
O que eu quero é que você faça uma análise racional, pragmática e estratégica sobre o tema. Faça essa análise não só considerando os prós e os contras mas, principalmente, o seu desejo em relação a sua carreira.
Entenda que, remotamente, suas chances de desenvolver uma carreira mais business e menos técnica serão prejudicadas em relação a quem atua de forma presencial. Uma das habilidades principais de um líder é sua capacidade de se relacionar com outras pessoas. Relacionar-se remotamente é mais difícil e menos eficaz.
Agora, se você pretende seguir uma carreira mais técnica, o remoto pode ser um bom caminho, dado que o trabalho técnico abrange mais tempo de solidão.
O que você não deve fazer é tratar o tema como uma paixão.
Nós programadores somos naturalmente introspectivos e anti sociais. Naturalmente e inconscientemente tenderemos a escolher trabalhar remotamente. Durante muitos anos eu achei que as minhas escolhas por uma carreira mais "solitária" eram totalmente racionais. Depois de muita psicanálise eu percebi que essas escolhas nada mais eram o meu medo de me relacionar com outras pessoas guiando minhas decisões.
Os nossos vieses nos fazem pensar de forma apaixonada e acreditar que estamos pensando de forma racional. É fato que existem pontos positivos e pontos negativos a serem considerados quando falamos de trabalho remoto. O que é preciso fazer é analisar a situação considerando o seu contexto, e de uma forma racional. Ou seja, fazer uma escolha calculando o custo-benefício em relação ao seu desejo de carreira e de vida.
Levando tudo isso em consideração, você é time remoto ou time presencial?
🫡 Esta foi mais uma edição da minha newsletter.
👋🏼 Bem vindos aos 42 novos leitores desde a semana passada.
👊🏼 O meu objetivo com essa newsletter é ajudar programadores que desejam empreender, ou que querem desenvolver seus soft-skills, mas ainda possuem uma visão muito técnica e pouco estratégica.
Além disso, pretendo também compartilhar outras coisas, como um pouco dos bastidores da construção de um negócio SaaS, as minhas opiniões e meus aprendizados. A ideia geral é ser uma documentação pública e estruturada dos meus aprendizados ao longo dos anos.
Portanto, se você se interessa por empreendedorismo, desenvolvimento pessoal e opiniões relativamente polêmicas, sugiro que você se inscreva para receber as próximas edições. ⬇️
📈 Se você é inscrito e quer me ajudar a construir uma newsletter cada vez mais relevante, separe alguns poucos minutinhos e me ajude respondendo algumas perguntas. Toque aqui para responder.
🗣 Se você tem alguma crítica, sugestão ou quer bater um papo, toque aqui e me chame no WhatsApp.
.
🙏🏼 Obrigado pelo seu tempo! Compartilhe este post com um programador que deseja empreender, ou quer/precisa desenvolver soft-skills para evoluir na carreira. ⬇️
Show, Moacir!
Já pensou em mentorar devs iniciantes? Esse é um produto e tanto, hein?!
Grande abraço!